A original igreja de Senhora Sant’Anna, hoje, seria um ponto turístico de Buerarema.

setembro 22, 2024



Este é o altar-mor da antiga Igreja de Senhora Sant’Anna, a padroeira de Buerarema. Este patrimônio não existe mais. Foto: acervo da família Tomás Sanjuan

     Todo lugar tem sua intelligentsia. Resguardadas as devidas proporções, Buerarema também

tem, e, talvez, sem saudosismo, já possuiu um grupo muito mais representativo no passado.

Paradoxalmente, esse passado parece não ter deixado um legado capaz de influenciar o

presente porque houve um momento em que se decidiu jogar fora tudo o que era velho,

arcaico, provavelmente coisas vistas como obsoletas. Assim destruíram as fachadas dos

imóveis, depois colocaram porta afora móveis antigos finamente talhados em madeira de lei

por mobiliário novo no design e no material de confecção. Aí começou o reinado do kitsch, e,

com ele, lá se foi embora a História, a nossa História.

Todo esse meu “bolodório” introdutório é por causa da fotografia que ilustra esse texto: o

altar-mor da velha igreja de Senhora Sant’Anna. Não sei as razões nem em que ano aconteceu

tal tragédia, pois quando observo esse pedaço da História de Buerarema, só posso considerar

que esse desmanche foi uma tragédia provocada pela ignorância, pela escuridão, tudo o

oposto do que tenta reunir uma intelligentsia.

    Agora, um pouco de reflexão sobre essa tragédia: as mesmas pessoas poderosas que foram

capazes de cometer tamanho sacrilégio, são, via de regra, as mesmas que se debandam para a

Europa – e outros continentes históricos – a admirar, regozijar-se diante de templos, museus e

monumentos seculares. Pura hipocrisia, não vou deixar de registrar essa palavra, ou, no

mínimo, maneira de tripudiar sobre os demais mortais cujos olhos jamais alcançarão a visão in

loco de uma Notre-Dame de Paris, ou, às vezes, o Templo do Buda de Esmeralda (Bangkok).

Por pior estado físico em que se encontrasse esse patrimônio histórico da cidade, jamais, em

tempo algum, ele poderia ter sido apagado. Foi uma decisão a se lamentar para sempre, uma

vez que aquele primor de construção com todos seus altares, nichos e ainda uma via sacra se

perderam para sempre. Faz tempo que religião não me interessa, por isso não sei se aquela pia

batismal também sucumbiu à sanha modernizadora. Ó tempora, ó mores! 



Por Gideon Rosa (ator, jornalista...)

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